quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A ELOQUÊNCIA DO SILÊNCIO

A ELOQUÊNCIA DO SILÊNCIO

“...Ele, porém, nada lhe respondeu...” (Mt 15, 23)

À súplica daquela mulher, Senhor, respondeste com a não-palavra do silêncio. Certamente a escutaste, porém preferiste silenciar-Te. Nada disseste, mas ela soube mergulhar na eloqüência de tua não-palavra e conseguiu compreender-Te. Não foste indiferente a sua dor e nem banalizaste seu sofrimento; não lhe deste as costas, sabendo que a Ti era possível reconstruir a vida da filha oprimida pela tirania do Mal; não a ignoraste, como eu, não raras vezes, o faço diante da aflição do meu próximo, tua e minha imagem.

Ensina-me, Senhor, a sofrer, paciente Tuas demoras; a esperar que tua não-palavra se converta em palavra-vida! Torna-me capaz de suportar as provas que purificam o amor e a esperar, confiante, a chegada de tua hora! Dá-me uma fé audaz e inquieta, como a da mulher cananéia, que não desmorona ante a resposta dita em silêncio, mas insiste e persiste na esperança do amor que não decepciona, na esperança em tua palavra que não confunde o coração. Fortalece-me, a fim de que eu não me desespere e nem me acomode frente aos horrores do Mal que aniquila vidas e entenebrece a história, que desumaniza o homem e o aliena.

Dá-me um coração vigilante, para saber escutar teu silêncio; um coração obediente, para saber acolhê-lo; um coração sábio, para saber compreendê-lo. Torne realmente videntes os olhos do meu coração, para que, pelo amor, se torne visível a mim o dom do Pai que és Tu e seja capaz de acolher-Te, hoje e sempre, nesta pequena mistura de tudo e nada que sou eu. Amém!

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Meditação sobre o Amor


Quem ama toca as estrelas

Jefferson Monsani

...porque não é possível crer sem amar!...

Esta reflexão dirige-se a quem consegue admitir, não sem dor ou saudade, que já saiu de si para residir em outrem. De fato, amar, para mim, significa deixar a clausura do eu para tentar fazer alguém feliz, uma vez que sem este intercâmbio existencial, certamente, o amor deixa de ser vivência para ser meramente sentimento. No amor, sentir é importante, mas viver é fundamental!

Como todo êxodo, a saída de si que o amar implica exige renúncias sérias e profundas, as quais configuram não um abandono da individualidade, um aprisionamento seu no cárcere da loucura, mas uma negação categórica do individualismo que descaracteriza e fere qualquer relação. Amar não significa negar-se, esquecer-se, mas perceber que o horizonte das potencialidades pessoais pode ser enriquecido se unido ao de outra pessoa. No amor, deixar o domicílio do eu é importante, mas abrir-se ao abraço do eu do outro, com seus tesouros e misérias, é fundamental!

Conheço algumas pessoas que têm medo de amar, justamente porque ainda não descobriram que o amar não é sinônimo de sexo, mas de atitude; não implica uma proximidade física constante e vazia, fadada à rotina e ao caos, mas uma proximidade interior inabalável e verdadeira. A paixão, com efeito, se contenta com o exterior, com o mutável, simplesmente porque ela, em si, já nasce condenada a fenecer em breve. O amor, ao contrário, perscruta o interior, sonda as profundezas, brinca com as realidades que transcendem àquilo que é puramente humano, sendo capaz de edificar novamente o que o vento e o fogo da paixão têm o poder de destruir. Por isso, quem se apaixona colhe flores, mas quem ama colhe estrelas. Quem se apaixona chora a partida do outro, mas quem ama morre em seu lugar.


Como compreender este mistério tão impressionante? Aliás, compreendê-lo é possível? Talvez como a vida, como escreveu Clarice Linspector, ele ultrapasse todo entendimento, constituindo o rol daquelas realidades que, conforme bem disse Pascal, fazem a razão humana tomar ciência de sua limitação. Ame, portanto, pois um mundo diferente nascerá quando o homem deixar de temer o amor!

quinta-feira, 24 de junho de 2010

REFLEXÃO PARA O 12º DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO C


“O CRISTO DE DEUS”

Reflexão para a liturgia do 12º domingo do tempo Comum

Jefferson Monsani

Zc 12, 10-11; 13, 1
Salmo 62 (63)
Gl 3, 26-29
Lc 9, 18-24


Irmãs e irmãos caríssimos, a liturgia deste 12º domingo do tempo Comum coloca-nos em contato com uma realidade intimamente humana, intrínseca, podemos dizer, à existência de todo homem em pleno uso de suas faculdades racionais: questionar-se acerca daquilo que se é! Tal questionamento, com efeito, é essencialmente ontológico e antropológico, posto que não se dirige às situações contingentes do existir – cor da pele, nacionalidade, profissão, dentre outras –, mas à sua própria essência, ao eu em sua realidade mais reservada e profunda. Reside, pois, no interior da pergunta quem sou eu? uma indagação acerca da verdadeira identidade do homem, daquilo que faz que ele seja o que de fato é!

O trecho do Evangelho segundo Lucas hoje proclamado apresenta-nos Jesus perguntando a seus apóstolos acerca de seu ser, primeiro de um modo geral: “Quem diz o povo que eu sou?” (Lc 9, 18), depois de um modo particular: “E vós, quem dizeis que eu sou?” (Lc 9, 20). Pedro toma a dianteira e, em nome dos doze, como uma solene profissão de fé, revela o mistério da intimidade e da identidade d’Aquele que um dia, à beira do lago, o chamara: “O Cristo de Deus”. Também neste momento, como em Belém, em Caná e no Jordão, acontece uma espécie de epifania da realidade mais profunda que constitui o ser de Jesus: Ele não é simplesmente homem, tampouco mais um profeta dentre tantos; Ele é o próprio Deus, em virtude da união consubstancial com o Pai e o Espírito Santo, que vem visitar o seu povo (Cf. Lc ). A partir desse momento, podemos dizer, um novo tempo se descortina no seguimento ao Mestre e a viagem que empreendem a Jerusalém se transforma em uma espécie de viagem interior, cujo significado só poderá ser de fato compreendido no escopo da caminhada: “O Filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumo sacerdotes e doutores da lei, deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia” (Lc 9, 22). Está, portanto, revelado o ser de Jesus e a essência desse ser: Ele é Deus e seu íntimo se chama amor!


Ora, Jesus poderia parar por aqui. Todavia, Ele nos associa àquilo que diz de Si mesmo. À luz da revelação de quem Ele é, revela quem nós somos chamados a ser. Recorramos, antes, ao texto da carta de São Paulo aos Gálatas: “Vós todos sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo. Vós todos que fostes batizados em Cristo vos revestistes de Cristo” (Gl 3, 26-27). A humanidade, com efeito, é um predicado comum a todos nós. Todos nós, pelo simples fato de existir, pertencemos à grande família humana. Entretanto, Paulo nos fala de uma espécie de renascimento pelo qual passamos mediante o batismo, quando somos revestidos de Cristo, ou seja, somos inseridos em seu Corpo, que é a Igreja, e tomamos parte em sua filiação divina. Recebemos, ademais, o dom inestimável da fé, que nos retira do isolamento do eu e nos insere em outra grande família: a dos filhos e filhas de Deus. Ser revestido de Cristo, deveras, significa realizar com Cristo um câmbio de existência e de missão que implica, por sua vez, tomar parte em sua glória e também em sua cruz: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia e siga-me” (Lc 9, 23).

O modo de seguir a Cristo que hoje nós encontramos bastante disseminado não é, certamente, o modo proposto por Ele. O cristão quer seguir a Cristo, mas – eis o dilema! – não quer aceitar a cruz que lhe cabe carregar. Deve haver algo de estranho com esse cristianismo que nega a realidade que lhe caracteriza, propondo um Jesus diferente daquele descrito por Ele mesmo. O tomar a cruz às costas e segui-Lo, por outro lado, não configura um prazer pelo sofrimento, um sofrer por sofrer, uma atitude masoquista diante da dor e da vida em si. O significado dessa palavra se esclarece no último versículo proclamado: “Quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará” (Lc 9, 24). A cruz a que Jesus se refere é a de amar com e como Ele, pois somente quem ama é capaz de doar a sua vida para que outro continue a viver. Certa vez, em um diálogo místico com Santa Ângela de Foligno, enquanto meditava o mistério da Paixão, Cristo lhe disse: “Não foi para brincar, Ângela, que te amei!”. Amar, de fato, é decisão e compromisso; é sentir, mas é sobretudo agir. Ama de verdade quem é capaz de perder sua vida, ou seja, doá-la no amor, descobrindo que ela só pode ser salva, que nós só podemos vivê-la plenamente quando a entregamos. Inúmeros cristãos, de ontem e de hoje, certamente compreenderam esta lógica tão diferente da nossa, inexplicável e até escandalosa.


Que a meditação da liturgia de hoje nos ajude a permanecer firmes na fé que Pedro proclamara e nos ensine a buscar, cada vez mais, conhecer a Cristo para, a partir d’Ele, nos conhecermos também a nós. Amém!

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

REFLEXÃO PARA O NATAL DO SENHOR - Jefferson Monsani


VAMOS A BELÉM!

Creio que a mesma afirmação dirigida à noite em que Cristo ressuscitou dos mortos – noite mais clara que o dia – pode, perfeitamente, ser aplicada a esta santa noite, cujos resplendores iluminam a terra inteira, fazendo-a despertar do torpor que a mantinha inerte, vazia, sem vida. Tal luminosidade nunca vista, oriunda do estábulo de Belém, clarifica o caminho do homem errante, perdido por vias calcadas sobre sua auto-suficiência, sujeito aos riscos advindos de suas preferências, posto que, não raras vezes, tais escolhas estão assaz distantes do plano salvador de Deus. De fato, a luz que emana do Salvador reclinado na manjedoura desvela o olhar do ser humano, fazendo-o descobrir o quão bela é sua existência quando orientada por Deus e para Ele.

Com efeito, retomando a colocação antes feita, é possível correlacionar a noite de Natal com aquela do “primeiro dia da semana” (Jo. 20, 1), uma vez que parecem tão belas e singulares, únicas nos acontecimentos que lhes assaltam. Na primeira – cujas alegrias, hoje, tomam conta de nossa alma –, em singelo estábulo, já que “não havia lugar para eles na hospedaria” (Lc. 2, 7) , nasce o Verbo de Deus, o Príncipe da paz segundo a profecia de Isaías (Is. 9, 5), longe, portanto, de toda riqueza ou aparato meramente humanos. O Filho de Deus se faz homem, precisamente, para recriar a humanidade corrompida pelo desenfreado desejo de dominar a tudo. Ele, “que nem os céus podem conter”, toma carne da carne de Maria Santíssima e se faz homem para renovar o homem, mesmo se sua fragilidade pareça loucura aos soberbos sonhos do ser humano em relação ao seu Salvador. Já na segunda, três dias após o escândalo da Cruz – trono oferecido ao genuíno Rei do Universo - mais uma vez brilha a luz de Deus sobre as pretensiosas maquinações do homem, gritando aos quatro cantos do mundo que a última palavra é a do seu Amor, que recria e renova todas as coisas. Desse modo, esta profunda palavra da literatura apocalíptica parece brotar dos lábios do Cristo em ambas noites, ou seja, em Belém e em Jerusalém: “Eis que faço novas todas as coisas!” (Ap. 21, 5).

O Natal do Senhor que hoje celebramos, pascal em sua essência, é a festa da restauração do homem, da iluminação do mundo, da revitalização das forças do ser humano para todo o sempre. Todavia, passados dois milênios do nascimento de Deus na fragilidade da carne, pode-se perceber a humanidade caminhando desorientada em busca de uma luz, esquecida de que, conforme profetizara Isaías, brilhou uma luz para o povo que caminhava nas trevas. Destarte, nesse dia, o desejo mais segreto e profundo de nosso coração é de que a Luz, ou seja, Cristo, brilhe sobre a humanidade que caminha na escuridão do pecado, na penumbra da falta de fé, no cansaço da falta de esperança e na falta inaceitável de caridade. O Verbo encarnado, reclinado na austera manjedoura, é o maior sinal do grande amor com o qual o Pai nos ama; é o próprio Céu a nos dizer que Deus não desistiu de sua criação, isto é, que Ele, em seu Filho feito carne, espera e acredita em nós, não obstante a frágil argila da qual somos feitos.

O Natal do Salvador, bem distante da festa puramente consumista por muitos celebrada, é momento propício de profunda reflexão e decidida conversão que a santa Igreja nos proporciona, jamais nos esquecendo dos dois belos exemplos de vivência dessa espiritualidade natalina oriundos das Escrituras: Maria Santíssima e seu esposo José, o homem justo. Creio que a pronta disponibilidade da Virgem à voz do arcanjo Gabriel, quando lhe fora anunciada sua divina maternidade e pedido seu assentimento, bem como o bom coração de São José, sua posição íntegra ao perceber grávida sua noiva, são posturas que precisam ser por nós assumidas. Se a sociedade pós-moderna grita ferozmente sua mentalidade relativista, seu exacerbado individualismo e sua firme resolução de banir o Deus da Vida de seu meio, Maria e seu casto esposo nos ensinam o valor da fé confiante Naquele que a tudo transcende e vivifica e a necessidade da caridade e do coração aberto ao irmão mais carente; nos dizem, com seu existir, a beleza da simplicidade e da humildade, do perdão e da reconciliação, da fraternidade e da verdadeira alegria que devem animar o coração do homem nesta ocasião em que o Céu desce a nós para nos elevar. Só consegue amar o menino deitado no presépio e perceber o misterioso e inenarrável segredo Nele encerrado aquele que trilhar o caminho de Maria e de José, posto que estas coisas são veladas aos sábios e entendidos e reveladas aos pequeninos (cf. Mt. 11, 25). A maravilhosa luz que emana do Cristo recém-nascido não pode iluminar, portanto, aqueles que preferem confiar somente em si mesmos, que se decidiram por sua própria justiça, que se fecharam em um mundo escuro e vazio, muito embora repleto de bens.

Vamos a Belém!, é o convite que a sagrada Liturgia desta noite nos oferece, irresistível àqueles que são bem aventurados: os pobres em espírito, os aflitos, os mansos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os que promovem a paz, os perseguidos, insultados e caluniados (cf. Mt. 5, 1-11), porque Aquele que nasceu é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim, a fonte de água viva (Ap. 21, 6), a luz verdadeira, aquela que ilumina todo homem (Jo. 1, 9). Essa Luz verdadeira, mais intensa do que o sol e mais brilhante do que a dos astros que cortam a penumbra dos céus em noites escuras, não pode ser extinguida pela poder das trevas (cf. Jo. 1, 5), conforme assevera o apóstolo João, e esta sua eternidade é o motivo de nossa esperança. Felizes os olhos que, por Ele iluminados, conseguirem enxergar para além de sua fragilidade e perceberem Nele a Salvação por Deus prometida, preparada diante de todos os povos (cf. Lc. 2 30-31) e felizes os corações que conseguirem sentir a santa alegria que invadiu o espírito de Maria, de José, dos pastores e dos magos ao contemplarem o Rei dos Céus revestido de nossa carne, perto de nós, de nossas dores e sofrimentos, de nossos medos e inquietações, de nossa fragilidade e finitude. O Natal, dessa maneira, é a festa da iniciativa de Deus, que não se contentando em estar perto de nós, quis ser um de nós, quis armar sua tenda entre nós (cf. Jo. 1, 14) e divinizar, em si mesmo, a humanidade dos seus. Ele aguarda, também, a nossa iniciativa.

Vamos a Belém e vamos confiantes, pois sob a frágil aparência de criança nós encontramos o Messias e Nele a razão de nossa existência e a luz para nossos caminhos!

Jeff Monsani
25 de dezembro de 2007

...Homenagem à mais bela de todas as mulheres...

Sorriso afável, rosto assaz bondoso,
Em tez morena, lânguida matiz,
Expressa em si um povo que é feliz,
Resguarda ,em prece, o filho piedoso.

Quais açucenas sob luz radiosa,
Flores adornam as belas cabeleiras,
E um diadema, posto nas fronteiras,
Dignifica a imagem carinhosa.

As mãos tão finas, puras, delicadas
Repousam postas, plenas de alegria,
Por sobre o ventre, casa ilibada

Que oculta, meigo, a Estrela da Justiça,
Seja esta loa, assim, à Imaculada,
Louvor sereno à Santa Mãe Maria.